Mostrar mensagens com a etiqueta kindle. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta kindle. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Leitura do Dia

Às vezes, apetece-me ler o meu romance histórico no telemóvel / celular. Invariavelmente pela manhã. Hoje foi um desses dias…

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

"𝐎 𝐎𝐫𝐢𝐞𝐧𝐭𝐞 𝐌í𝐬𝐭𝐢𝐜𝐨 𝐝𝐞 𝐂𝐡𝐚𝐨 𝐁𝐚𝐥ó𝐬", 𝐏𝐞𝐝𝐫𝐨 𝐃𝐚𝐧𝐢𝐞𝐥 𝐝𝐞 𝐎𝐥𝐢𝐯𝐞𝐢𝐫𝐚, 𝐌𝐚𝐢𝐨 𝟐𝟎𝟐𝟐.

Leia a história de um português do século XVI que deixa o Reino de Portugal e se aventura no Oriente distante onde conhece Fernão Mendes Pinto, Luís Vaz de Camões e S. Francisco Xavier: https://www.amzn.com/B09Y6B8Y5Q

terça-feira, 30 de agosto de 2022

Momento Quora

Eu planejo escrever um livro que se passará no século XV ou XIV. Onde e como devo começar minha pesquisa?

Escrevi um romance histórico no século XVI. Foi um livro de grande fôlego, com muitas páginas.

No meu caso, fui fazendo “especialização” (o termo é meu), à medida que ia escrevendo capítulos. Explico melhor…

A história começa numa vila portuguesa. Então, estudei essa vila no século XVI e também as personagens iniciais.

Depois foi Lisboa, e seguiu-se a viagem de barco (nau) para a Índia.

A próxima fase de estudo foi a vida em Goa e na Índia, e por aí adiante.

Muitas vezes relia os capítulos já escritos e reescrevia / acrescentava / cortava. Outras vezes, iniciava um capítulo (deixava uma ideia) e depois com o tempo conseguia desenvolvê-lo, ou mudar de direcção, consoante o conhecimento que fui adquirindo.

A parte mais engraçada é que sempre soube como começava e acabava a história, mas o resto fui sempre construindo ou mudando.

À medida que vai avançando no livro, vai tendo mais conhecimento histórico e sensibilidade para escrever mais e melhor sobre a sua história.

Vai passar por momentos de muita alegria, mas também de frustração. Não desista! Espero que lhe tenha ajudado de alguma forma. Boa sorte :)

Veja o link no Quora: https://qr.ae/pvbfjy

sexta-feira, 19 de agosto de 2022

"O Oriente Místico de Chao Balós", Cap. XX

Cativos no mar Arábico 

“Depois de levantarmos âncora deste formoso porto de Mascáte, velejávamos por nossa derrota no mar alto quando enxergámos a aproximação de duas naus pejadas de mouros, sem pormos diante dos olhos o cometimento que nos esperava.

Ao percebermos que as ditas embarcações nos vinham fazer guerra, empreendemos as maiores pressas para fugirmos do perigo em que já estávamos metidos; porém fomos logo assombrados com tiros de falcões, roqueiros, e berços, que nos romperam as velas. Três dos nossos morreram queimados, por causa das panelas de pólvora, que lançaram sobre nós, e ao sermos abalroados puseram 50 ou 60 mouros dentro da nau, ficando todos nós rendidos”.

quarta-feira, 17 de agosto de 2022

"O Oriente Místico de Chao Balós", Cap. XIX

Viagem à Arábia e Pérsia

“Aziscão, da privança do Xech Raxit, passava muitas vezes à cidade de Goa aonde fazia com muy grosso proveito o trato privado de aljofre, e pérolas da ilha Barem, que fica ali a cinco dias de navegação de Ormuz. Homem muito alto, e formoso, de tez alva, e bem apessoado, vestia os seus panos de seda apertados por uma rica cinta com adaga guarnecida a ouro, e prata.

Muito me alegrava fazer falas com a sua filha, por nome Caman, quando os parentes, e as criadas, não estavam por perto, e os dois mercadores se deleitavam à mesa por largo tempo com faustos banquetes, recolhendo-se depois para tocar, e ouvir boa música, com os instrumentos próprios da terra. O meu coração palpitava, como que a querer sair fora do peito, quando trocávamos olhares, ou cochichávamos fora das vistas do seu pai, e todos os seus outros parentes”.

sexta-feira, 12 de agosto de 2022

Capítulo XVIII

Do que mais sucedeu até Nuno da Cunha chegar à Índia como governador:

Pero de Faria, arrebatado por uma grande ira, mandou chamar o Governador, o qual chegando com os seus à rua de São Jorge viu grande cópia de gente (onde também se achava esta minha pessoa), com muitas lanças, e alabardas, nas mãos: a qual gente acorria à causa de Heytor da Silveira. Vendo o Governador que Heytor da Silveira se achava com os seus partidários, e pelo risco em que tudo ficava, rompeu muy supitamente pela gente, com o propósito de chegar defronte das casas. Diogo da Silveira chegando-se ao balcão fez uma fala desta maneira para quem na rua estava pelo seu primo:

Não vedes, Senhores! Isto, que quer Lopo Vaz, que aí está, tomar por força a governança da India, a cuja é, mas não é bem que lhe consintam.

Entrando-me isto pelas orelhas, tirei logo a adaga da cinta, pois era minha determinação chegar à beira do Governador, e fazer justiça por minhas próprias mãos. Havia que lhe dar este merecimento o quanto antes para salvação da nossa India, e glorificar o trabalho d’el Rey de Portugal, que arruinado já estava com Lopo Vaz de Sampayo. Com tudo fui logo agarrado nas mãos, e peito, por Saipe, e outros dois marinheiros da minha esquipagem, os quais me rogaram para não começar esta briga; porque dela poderíamos sair muito mal tratados, e com risco de nossa própria vida”.

quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Capítulo XVII

As diferenças entre Lopo Vaz de Sampaio e Pero Mascarenhas:

Neste ano de 1526, zarpava de Portugal mais uma armada da Carreira da Índia, com duas novas sucessões, enviadas por el-Rei D. João III, ao governador D. Henrique de Menezes, após o monarca ter recebido a notícia, em Outubro do ano anterior, da morte de Vasco da Gama, e respectiva sucessão. Eram capitães desta armada Francisco de Anhaia, Tristão Vaz da Veiga, António de Abreu, Vicente Gil e António Galvão (não houve capitão-mor).

Chegando os dois primeiros a Cochim com as vias de sucessão, não quiseram entregá-las a Afonso Mexia, dado que não podiam fazê-lo a D. Henrique de Menezes, que já tinha falecido, nem a Pero Mascarenhas, que era o legítimo governador, mas estava em Malaca. Tal facto não demoveu o vedor da fazenda, que depois de convencê-los a muito custo do contrário por requerimentos e debates chamou a si a responsabilidade de abrir as sucessões, que indicavam Lopo Vaz de Sampaio como governador na morte de D. Henrique de Menezes, e António de Miranda de Azevedo como capitão-mor do mar, enquanto Pero Mascarenhas sucedia a Lopo Vaz de Sampaio na sua morte.

Num alvará solto que Afonso Mexia encontrou nas vias, D. João III explicava a D. Henrique de Menezes, e ao vedor da fazenda, que não se usasse as sucessões dos governadores que estavam na Índia, mas que as enviasse fechadas no segredo em que estavam. E se as novas sucessões não chegassem à Índia e falecesse D. Henrique de Menezes, também não seriam abertas as antigas, dado que governava Lopo Vaz de Sampaio até chegarem as novas, sendo então governador quem nelas fosse nomeado. Deste alvará se disse que fora falseado, e metido nele esta parte de dizer que Lopo Vaz governasse até virem as sucessões novas, assinalou Gaspar Correia”.

terça-feira, 9 de agosto de 2022

Momento Quora

"Por que o primeiro capítulo de um livro ou romance é o mais importante e difícil de escrever?" Veja a minha resposta à pergunta do Quora: https://qr.ae/pv5sqd

Tive essa experiência ao escrever o meu primeiro romance histórico, "O Oriente Místico de Chao Balós"

O início da narrativa é de primordial importância para atrair ou cativar o leitor. Se é apelativo, certamente cresce o desejo de continuar a leitura.

Diria que os primeiros dois/três capítulos da minha obra - num total de 43 - foram os mais difíceis de compor, com incontáveis revisões, cortes e acrescentos, no estilo de escrita coeva e na gramática. Hoje consigo perceber que a maior dificuldade sentida foi por as personagens e a trama estarem ainda numa fase bastante embrionária.

À medida que a escrita foi avançando, também o processo de amadurecimento e conhecimento histórico sobre vários temas versados no livro foi aumentando consideravelmente, sendo por isso imperativo fazer as devidas correções (sempre que justificáveis).

Tive muito menos dificuldades nos restantes capítulos. Alguns, mesmo, foram bastante fáceis de redigir, pois já tinha uma ideia definida sobre que rumo a dar à história; pela experiência adquirida no estilo de escrita; e pela visão mais clara sobre os acontecimentos da época.

segunda-feira, 8 de agosto de 2022

"O Oriente Místico de Chao Balós", Cap. XVI

Prisioneiros de um rei da costa do Malabar:

“A nós nos serviu por língua um nativo, que fora piloto num junco da costa do Malayo, evitando-se assim maior dano para os nossos. A ele lhe contei miudamente o triste caso que nos fez chegar à praia desta costa, assim os muitos trabalhos, como a grande fome de todos nós; porque o que agora mais desejávamos era estarmos providos de agasalho, termos o que comer, e arranjar maneira de tornarmos a Goa. Com isso não éramos espiões, que vinham aqui colher informações para depois avisarmos os nossos; os quais aqui vindo, e apanhando esta villa desprevenida de defesas, a destruíam de todo, a ferro e fogo, como sucedera com outras povoações da costa do Malabar, que não obedeciam à Lei d’el Rey de Portugal.

Sentindo ele muito a nossa infelicidade logo lhe pedi muito que dissesse, ao Rey da sua gente, para nos conceder uma audiência; porém não soube como atender ao meu pedido; porque Sua Alteza estava enferma, e não lhe restava muito mais tempo de vida. A el Rey lhe fora dito, por um sacerdote da sua gentílica seita, que não lhe era permitido se valer das curas que correm no Malabar; porque assim lhe revelara o ídolo de um pagode da sua idolatria, sob pena de um terrível castigo pôr em risco a sua pessoa, e seu Estado.

Fazendo muito caso desta feitiçaria do seu sacerdote, e assaz desesperado pelo que lhe entrara nos ouvidos, sentenciara el Rey a morte de todos nós para daí a dois dias; porque recebendo o seu ídolo os sacrifícios, teria ele a vida poupada, conforme lhe dissera aquele ministro da sua corrupta idolatria. Tivemos muy grande medo do que nos esperava, e após termos esta triste nova confirmada deixou o língua de vir até nós, e nem comida nos trouxe”.

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Primeiro Esboço

O primeiro esboço da capa para o romance histórico “O Oriente Místico de Chao Balós” pela mão do conceituado cartoonista Rodrigo de Matos (Rodrigo Cartoon).



quinta-feira, 4 de agosto de 2022

"O Oriente Místico de Chao Balós", Cap. XV

Da ida a Bisnaga, capital do Reino de Narsinga:

Vai este Reyno de Narsinga, que por outro nome se chama terra do Canará, desde os muitos lugares que há nele na costa da India, digo Amcola, Mirgeo, Honor, Baticala, Mangalor, Bracalor, Bacanor (onde el Rey de Portugal tem as suas feitorias), e outras mais povoações da banda do Oeste, até ir ter a Balagate, e ao Charamandel, da banda do Leste, e ao Reyno de Orixá, ou Orya, que parte com Bengala, e ao Reyno Daquem, da banda do Norte.

Para bom governo do Reyno tem el Rey Crisnarao os seus oficiais, digo o regedor, a segunda pessoa que há nele, e o tesoureiro (com os seus escrivães da fazenda), o tesoureiro mor, o porteiro mor, o tesoureiro da pedraria, o estribeiro mor, e o que mais há somente tem capitães, todos gentios, por quem reparte o seu Reyno, por quanto não tem outros oficiais. Assim me disse um honrado mercador da terra que el Rey já tinha determinado que o seu filho de seis anos o havia de suceder em vida; porque desejava descansar na velhice, depois de alcançar muitos, e grandes sucessos nas guerras, como fora na tomada de Rachol ao Hidalcão, num grande feito de Christovão de Figueiredo, casado de Goa, que fazia o trato de cavalos para Bisnaga, e à sua gente, vinte Portugueses espingardeiros”.

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

sexta-feira, 22 de julho de 2022

"O Oriente Místico de Chao Balós", Cap. XI

Chegada a Goa:

“Na manhã seguinte vimos muitas toninhas, várias borboletas, e algumas cobras, sem avistarmos terra firme. À tarde foi lançado o prumo ao mar, o qual tomou o fundo a 50 braças. Não tardámos a ver os Ilhéus Queimados, que são muitos; ainda que só dez deles se levantam a boa altura. E como neles nada cresce, pois são rochedos estéreis plantados no mar, e estão faltos de água, ficaram conhecidos por este nome de Ilhéus Queimados.

Andando mais dez léguas de caminho, surgimos na barra de Goa no primeiro dia do mês de Abril [de 1524], e sendo Diogo da Silveira visitado pelos mais importantes da cidade, lhe disseram que nos detivéssemos aqui alguns dias; porque era necessário assegurar que nenhuma maleita fosse levada para a cidade nem que a povoação sofresse de algum mal.

Passando este tempo entrou a capitânia pelo rio acima embandeirada com formosas bandeiras, e estandartes de seda. Após salvar a fortaleza com grande estrondo, chegou Diogo da Silveira ao cais, para aqui desembarcar ao som de muitos instrumentos. À sua espera estava o capitão de Goa, digo Francisco Pereira Pestana, assim como os vereadores, e oficiais da cidade, sendo recebido com grandes cortesias”.

quarta-feira, 20 de julho de 2022

Capítulo X

Cabo das Agulhas e Cabo das Correntes:

“A jornada continuava a tirar esta minha pessoa das muitas ignorâncias que tinha do mundo, ao ficar agora a saber pelo nosso piloto mor que o promontório do cabo das Agulhas ganhara este nome, por ser nesta paragem que as agulhas de marear feriam nos verdadeiros pollos do mundo; porque olhavam contra o Norte. Na manhã do outro dia fomos atingidos por um vento rijíssimo de causar muito enjoo, abrandavam um bocado as cargas de neve, que caíam no mar oceano fazia dois dias.

Abalados pelos contrastes que nos sobrevieram, fomos forçados a nos apartar, uns dos outros, andando cada nave da Armada pelo caminho que melhor lhe pareceu. E como o frio me apoquentava a carne, chegou a febre acesa neste tempo, pela qual razão fiquei recolhido no camarote, até chegarmos a Moçambique. Só Deus, Nosso Senhor, sabe os muitos trabalhos que a nau Salvador passou para governar ao longo da costa; porque as grandes correntes de águas muito rijas [que vinham do Cabo das Correntes] faziam a embarcação descair muito a Sudueste”.


domingo, 17 de julho de 2022

Capítulo IX

 Perigo de Vida:

"Abatido pela fadiga, que resultava de largas semanas de viagem no mar alto, foi numa certa tarde ventosa de me causar assaz de aborrecimento que aproveitei para tomar algum repouso; porém depressa acordei sobressaltado, por causa da ondulação que teimava em sacudir a nau. Cuidei em tomar o ar fresco no convés; mas o vento soprava muito rijo de Norte, e o sol mal alumiado queria muito nos deixar à sorte. O cheiro fétido a pairar no ar era sinal mais do que aprovado que o diabo esfregava as mãos de vil satisfação, por estar muy pronto a reclamar mais algumas almas para as profundezas do Inferno.

Fiquei muy assustado quando meteu tanto mar no costado, que mais parecia que a nau ia ao fundo a cada balanço que dava, e mais temeroso fiquei quando arreei os joelhos no tabuado logo após o embate de outra vaga de água no costado. Havia que sair deste horrível lugar, o quanto antes, e tomar abrigo em parte segura. Com assaz de pressa quis galgar para o chapitéu de popa; mas ao agarrar as madeiras da nau, para não perder o equilíbrio, fiquei com o rosto tomado pelo horror; porque uma grandíssima tromba de água varreu o convés, sem dela escaparem quatro marinheiros. A morte chegara muy apressada para eles!

Pus os olhos no céu, neste mesmo instante, tinha a roupa toda encharcada pela água da chuva. O vento rijo não queria repousar em nenhuma parte, e o frio a bater no rosto era sinal que a morte não guardava segredos nesta latitude. Quanto mais a nave cambaleava na fúria da tempestade maior era o medo de perdermos o leme. Roguei a Deus para que os dois homens muito rijos, que meneavam o leme com muy esforço de suas pessoas, o fizessem de contínuo, sem nunca levantar as mãos dele”.

quinta-feira, 14 de julho de 2022

Capítulo VIII

 Mortes a lamentar:

"Os tementes a Deus, com os joelhos prostrados defronte do altar, rompiam os ares com a voz em grito, pedindo-Lhe misericórdia para ficarem em salvo das enfermidades, assim como dos medos, e anseios, que tomavam conta das suas almas. Nem todos iam ter a felicidade de passar à India, pois havia mortes a lamentar pelo caminho. E sendo a que mais horror causou nos embarcados lembro agora o falecimento do barbeiro Francisco Tomé, que deu o último suspiro após a quinta sangria, que lhe fez um grumete no derradeiro dia de sua vida; posto que nem menos cinquenta onças de sangue terminaram com a grande tormenta da febre, que muito o afligia.

Chorei mil lágrimas quando o corpo do defunto, envolto numa mortalha, e com uma bola atada nos pés, foi lançado ao mar pouco depois de ser lembrada a sua habilidade para arrancar os dentes estragados dos embarcados. Francisco Tomé faleceu desta vida com mostras de muito bom cristão, o que a todos nos animou, e muito nos consolou”.


segunda-feira, 11 de julho de 2022

Capítulo VII

 O triste fim de um grumete:

"Num destes dias de grande tédio, por sinal de má memória, caiu à água do mar o grumete, por nome Martim da Gallega, que pouco sabia nadar. Os gritos do infeliz causaram logo grande alvoroço, e posto que alguns embarcados lhe atiraram com prontidão duas pipas, e algumas cordas, e com isso feito o desgraçado se manteve à tona de água muito esforçadamente, chegou tarde o salvamento; porque sendo o dito grumete trazido para o convés, passada que estava uma hora e meia de sua triste queda, deu com assaz agonia o derradeiro suspiro no braço do Padre Lançarote. 

Confessando-se, a muito custo, pouco antes de partir desta vida temporal, escorreram em nós muitas lágrimas de alegria pelo consolo de sabermos que não perdera a vida eterna. Paz à sua alma! A morte do dito grumete levantou suspeita, e o mareante que mostrou resistência ao socorro (o tal que muito o repreendia, e muito lhe batia) foi achado culpado. Em boa verdade fora eu quem dissera ao meirinho o que ouvira do próprio Martim da Gallega, acerca das ameaças que tivera do rude marinheiro:

– Temia muito ser mandado borda fora no breu da noite, se botasse faladura do concerto havido entre os corruptos marinheiros, e a horrível mulher com o cabelo curto, a que fora achada roupada como homem...”


sábado, 9 de julho de 2022

Capítulo VI

O terrível pairo:

"Com a nau ao pairo chegaram os fortes calores, as doenças tomaram conta dos desafortunados, e muitos passageiros foram tomados pelo enfadamento. Tanto estragada ficou a maior parte das cousas de comer; porque tanto fervia o azeite, o mel, a manteiga, e a marmelada, assim como corrompida no sabor se achou a fruta passada, e outras cousas da nossa alimentação. A água das pipas, parecendo criar bichos, era de tão mau cheiro, que para evitarmos a revolta das entranhas a bebíamos em pequenos goles, com os olhos fechados, e o nariz tapado.

A falta de água doce era a maior preocupação do Padre Miguel Lançarote (ficou como enfermeiro certo para o resto da viagem); porque sem ela não sossegavam os maus humores dos enfermos nem se cozia a carne de galinha para fazer o caldo que muito socorro dava à cura de todos eles. Mas como era desolador ver a frota rodeada por tanta água do mar oceano, que para nada servia, nem para saciar a sede nem para a cozedura dos alimentos, tão pouco para lavar o corpo!


 

quarta-feira, 22 de junho de 2022

"O Oriente Místico de Chao Balós", Cap. V

Pareceres dos pilotos sobre a derrota da Armada:

"Ao décimo dia de viagem escutei dois tiros da capitânia, por ser necessário que chegassem até nós os pilotos da Armada, e saber que parecer tinham de quantas léguas íamos afastados do rio Grande, e quanto tempo iam as velas esperar na ilha a que chamamos Moçambique. Concordaram todos com o piloto mor que a derrota tinha de ser feita por dentro, chegando nós ao cabo de Boa Esperança, até aos 25 do mês de Julho, e que a partida da fortaleza de Moçambique (para passarmos à India) acontecia dos 10 aos 15 dias do mês de Agosto, seguindo a derrota da ilha do Combaro. E se a Armada dobrasse tarde o cabo de Boa Esperança? Seria a governação feita por fora da ilha de São Lourenço?

Os pilotos da Santo Espírito, e da São Leão, mostraram oposição; porque as suas naus levavam muita gente, e havia pouca água doce disponível para tão larga viagem. Para eles era mais certo invernar em Moçambique, do que passar pelo perigo de morrermos todos à sede. Para o piloto da Loba era aconselhável fazer a derrota por fora, mesmo com o risco de perdermos vidas, que não chegariam a uma sexta parte, se a Armada fosse invernar em Moçambique, onde as doenças iam consumir muitas mais almas, cada dia que gastássemos em terra. Por derradeiro, assentando com o capitão mor que a derrota se faria por dentro, assinaram todos a causa, e tornaram de batel às suas naus”.

À venda na Amazon

PORQUE VOAS TÃO ALTO? Este livro de poesia é uma viagem intensa pelas experiências de vida de um possível alter ego do autor. Desde o camp...